sexta-feira, 15 de julho de 2011

FAKE LOOK - Blogonovela em três actos (I)


Fake Look

I

O tédio instalara-se na sua vida como uma doença, cada dia que passava naquela casa cumprindo o ramerrão diário o tornava mais melancólico. O dia dos dezanove anos de casamento havia passado sem grandes festejos, apenas um breve jantar em memória do amor arrefecido. Falaram nos vinte cinco anos, nas bodas de prata, planearam festejar e de como a festa iria ser bonita, com padre e tudo. Gabriel e Maria viviam a mesma rotina há quase duas décadas: ela sentia-se feliz vivendo no torpor de um dia depois do outro e armava sorrisos ocasionais; ele, sem tanto amor nem sorrir, nos últimos cinco anos definhara e passara a andar acabrunhado. Ela fora o seu único amor, o seu único caso e mulher desde que se casara, nunca existiram rivais para ela ou triângulos coloridos - nem sequer platónicos - nesta relação tão exclusivista. Tudo corria sem sobressaltos direito a um final a dois numa casa cheia de memórias sem futuro, até que um dia, no escritório, ao cumprir o ritual de todos os dias, o inusitado aconteceu. Ligou o computador, foi tomar um café morno na máquina do fundo do corredor e regressou depois de uma conversa de circunstância sobre o tsunami e o terramoto no Japão. Quando voltou ao seu gabinete e encarou o computador notou que recebera uma mensagem cujo assunto revelava: “Olá colega”
Talvez uma das habituais mensagens publicitárias, talvez uma ordem de serviço, talvez qualquer coisa tão aborrecida como a sua vida. O remetente era uma tal Madalena. Mas que Madalena? Não existia naquele escritório nenhuma Madalena. Normalmente a missiva teria passado despercebida e provavelmente acabaria no lixo, no esquecimento da sua estória sem estória. Mas a resposta às suas dúvidas estava a um clique, um clique apenas para satisfazer a sua curiosidade. E então leu:

Olá colega

Como estás tu? Que é feito de ti? Será que ainda te lembras de mim!? Nunca me esqueci de ti nem daquela noite tão divertida quanto louca no dia da entrega dos diplomas... ainda te recordas? que saudades dos tempos em que sonhávamos com um futuro que não era este que agora vivo.

Madalena M.

Não foi preciso muito para se lembrar de Madalena, a boa da Lena, a colega com quem estudara ao largo de cinco anos na mesma Universidade. A colega “marrona”, aquela que era muito aplicada e lhe arranjava os apontamentos das aulas a que raramente se dispunha a ir. A sua memória fervilhava cheia de felizes instantâneos. Passou à seguinte mensagem com a cabeça em febre, lembrando-se de Madalena, dos tempos de estudante, dos colegas e dos professores, das festas académicas e da vida boémia desse bom passado, daquela noite...


Joshua M.

Sem comentários: