sexta-feira, 22 de julho de 2011

FAKE LOOK - Blogonovela em três actos (II)


Fake Look

II

Uma semana depois, quando a breve alegria da mensagem de Madalena quase se havia desfeito na vagarosa monotonia dos dias de trabalho e no silêncio acordado das noites de solidão acompanhada, as mesmas sensações se repetiram como um eco amplificado. A recepção de nova mensagem despertou de novo as batidas do coração e de novo se lhe desfez o pensamento em imagens dispersas e longínquas. Afinal de contas não passava uma mensagem tão vulgar como as outras, a mesma que havia já recebido algumas dezenas senão centenas de vezes, enviadas por amigos e por outras pessoas, cuja tendência para convites sem interesse se acentua a coberto da rede. Era um convite para aderir a uma rede social. Mas esta... esta era diferente, era da sua colega Madalena. Ruborizou, desapertou o botão de cima da camisa, aliviou o nó da gravata, suores frios percorreram-lhe o corpo. Quando se acalmou, não hesitou e propôs-se de imediato aceitar o seu convite, acicatado por uma curiosidade impaciente, ávido de ver alguma foto sua, de saber algo sobre a sua vida actual. Estaria casada? Teria filhos? Onde viveria? Onde trabalharia?
Cumpridas as lentas e fastidosas formalidades de inscrição, navegou num mar de excitação e desejo indisfarçado. Foi direito à busca e ao perfil dela. Decorreu uma eternidade por breves segundos, até que chegou finalmente à procurada Lena. Nestas ocasiões as páginas de internet provocam, com o seu vagar, sofrimentos que parecem durar séculos.
Reviveu subitamente uma recordação acabada dos dias felizes do tempo outro. O retrato da jovem Lena surgia-lhe agora com a ténue nitidez de uma película impressionada há muitos anos: a moçoila breve e tranquila de faces rosadas, vinte anos de idade por cumprir, trajada por hábito de cores garridas quase festivas, a cinta fina e a saia rodada de forma a salientar as amplas curvas de um corpo inquieto e roliço. Ao chegar ao átrio da universidade espalhava sensualidade e um aroma a alfazema de forma desleixada. Era uma promessa consistente de uma beleza plácida ao atingir a maturidade.
Uma breve descrição pessoal revelava que vivia em Oeiras, era funcionária pública, bibliotecária, e estava casada. Gostava de cinema e de literatura, de música e de viagens, revelava uma sumária apresentação no seu perfil. Abriu o álbum de fotos e lá estava ela, com o seu porte elegante – mais magra, um rosto suavemente sulcado – mas sem dúvida ela, tocada pelas indeléveis marcas do tempo. A jovem bonita e de ar mimoso dos vintes anos dera lugar a uma mulher distinta, com um olhar mais triste mas ainda assim bela, seguramente ainda mais bela. Nunca Gabriel havia notado esta estranha beleza. Os traços eram os mesmos, a idade só os tinha acentuado.
Entretanto uma nova janela se abrira diante de si, como que por magia: era ela que através do chat lhe acenava um "olá" e um "há quanto tempo!". Depois de um emocional início de conversa, as teclas falaram longamente por ambos, sobre ambos, sobre o passado e o presente. Deram lugar ao futuro, combinaram encontrar-se na semana seguinte, concordaram num jantar a dois, trocaram números de telefone e despediram-se com beijos repetidos. Foi uma longa semana até ao reencontro, ela não lhe saíra do pensamento um só dia, um só segundo da sua vida, durante aqueles dias que se consumiram demoradamente até ao prometido.


Joshua M.

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