quarta-feira, 13 de julho de 2011


Como um romance

Uma das particularidades que mais fascina no trabalho de  Mario Bellatin é a maneira corajosa e até arrojada, como os seus livros misturam géneros, desobedecendo a formatações e transgredindo toda e qualquer regra de prateleira, classificação de livros e literatura. São livros que se desviam. Sendo que a procura de outros caminhos, passa muitas vezes por explorar os  limites da própria literatura. Isto dá trabalho, claro. Tinha a vida facilitada se, ao invés, se sentasse em frente ao portátil a escrever um romance. Mas já há tantos romances...
Numa altura em que o romance, enquanto género, canibaliza descaradamente outros géneros literários, fazem falta mais Bellatins. Muitos mais. 

Desconfio que, mais do que um sinal de vida, ver as livrarias inundadas de gordos romances é um sintoma inequívoco de um modelo em 'gloriosa' decadência.
Não é exagero dizer que este é o género que mais tem feito pela leitura - pela massificação dos livros, da literatura, da leitura  em geral.  O romance expandiu a 'leitura' e esta tem alimentado a voracidade do romance. Mas isto acabou por desvirtuar o seu modelo clássico e original.
Não deixa de ser irónico que aquele seu papel, tão relevante, tenha acabado por se transformar no seu maior carrasco: o romance engordou demasiado à custa da exigência da 'leitura', perdeu frescura e agilidade.  A sua postura alarve e 'imperial' tem provocado o esvaziamento de outros géneros e isso martiriza o seu modelo, ainda mais. A expressão (que tão levianamente usamos) " lê-se como um romance" resume bem o caminho de facilidade e facilitismo que glorificou e acabou por desgastar o romance.

Tenho ouvido alguns escritores dizerem que a revolução dos livros está para breve. (E eu já estou impaciente). Bellatin acrescenta que essa revolução está a ser encorajada e inflamada por via dos formatos digitais e do consequente fim do poderio do 'papel'. Como se, com o desaparecimento do objecto-livro fossem também as regras,  os limites, as classificações do seu universo.
Já era sem tempo!


Iolanda Bárria

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