quarta-feira, 8 de junho de 2011


PISO 7

Tive hoje, por razões de grande força, de ir ao Hospital de Santa Maria, em Lisboa. Mandaram-me ao Piso 7. Uma vez lá, fui reenviada ao Piso 1. Guichet. Tirar uma senha. Esperar. Senha n.º 275. Ordem de chamada: nº 204. 71 pessoas à minha frente. Reduzi-me à minha insignificância e pequenez perante aquele turbilhão de gente. Pensei nos dias e nas horas em que andamos envolvidos nos pequenos nadas das nossas vidinhas, esquecendo o que nos espera lá no fim, no fim de tudo, quando esse fim de tudo chega muitas vezes ainda no princípio. De volta ao Piso 7, falei com algumas pessoas. Jovem 24 anos: AVC. Jovem 30 anos: paralisia Facial. Jovem 43 anos: Esclerose Múltipla, Cegueira... A solidão da doença. A inutilidade do sonho. O sofrimento inexorável...

Reforcei hoje, mais uma vez, a ideia de que a vida é aqui. E, de todas as imagens que captei, fica retida a de uma senhora alta, morena, bem-vestida, aparentemente normal, não fosse o caso de insistir em percorrer o corredor por entre as gentes com palavras de ordem gritadas e pulso em riste, como que a reinvindicar o seu direito à loucura. Apeteceu-me segui-la. Também eu pretendo reinvindicar o meu lugarzinho vitalício naquela praia deserta onde o sol se põe com os tons do arco-íris e tu chegas no teu cavalo, Golias, para pernoitar e seguires viagem na manhã seguinte.


Carmo Miranda Machado

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