sexta-feira, 17 de dezembro de 2010


Encontro

Ao dobrar a esquina, sempre aérea como me é caracteristico, cruzei-me comigo própria. A princípio não me reconheci, em abono da verdade, nem me vi, fiz como aquelas pessoas que acusam os homeless de passar pelo próximo como se este fosse transparente. Foi assim que passei por mim, como se fosse transparente, inexistente para ser mais exacta. Alguns segundos mais tarde, olhei sobre o meu ombro e lá estava eu. Olhei-me com olhos crus. Agradeci interiormente o facto de ter por defeito ou feitio a tolerância, o respeito pela diferença, de dar a margem de dúvida necessária para que o outro se revele aos poucos, caso contrário ter-me-ia visto como alguém fechado sobre si, autista, ou pior, muito pior... Alguém que já não acredita no mundo, na humanidade. Alguem que se protege na ausência subtil da presença aparente.

Voltei para trás, olhei-me nos olhos, encarei-me de frente. Não foram precisas palavras. Mas ainda balbuciei em tom encorajador – "tenta!"


Lucinda Gray

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