quinta-feira, 29 de julho de 2010


O Universo dos Amantes

O universo dos amantes é perfeito ou sonha em ser perfeito. Entende-se por amante aquele que ama, acepção que vem do particípio do presente do verbo latino amare, amans. Mais nada.
O universo dos amantes é um cosmo à parte, com leis muito próprias, e os cosmonautas, os amantes, vivem num estado puro de letargia que os deixam inconscientemente embalados. A lucidez de sentidos e a racionalidade ficam afectadas, mas eles pouco se importam com isso. Aliás, eles fazem questão de alimentar esta condição de apatia relativamente ao resto do mundo. É este mandar o mundo à fava que os faz sentir especiais e diferentes, os faz sentir únicos e exclusivos, absolutos e inteiros, se em cisão permanente com o universo dos outros. É o mundo privado e íntimo que vale, o mundo a dois que interessa. É o sonhar a dois o mesmo sonho, o ser capaz de voar em pensamento de mãos dadas para a mesma ilha com a mesma água azul e a mesma areia branca e fina, é beber da mesma música e delirar da mesma forma, é apreciar as mesmas cores, os mesmos sabores, a mesma força da Natureza, é saber esquecer o tempo contra tudo e contra todos, é ter o mesmo ritmo e amar a mesma poesia, é partilhar as mesmas paixões, é saber comunicar pelo olhar, pelo abraço, pelo beijo, pela carícia e até pelo silêncio. É compreender as palavras de uma forma única, é precisar do calor mesmo quando não está frio, é estar em sintonia quando o mundo lá fora gira em arritmia.
Ter o privilégio de entrar nesta esfera privada que vive em unissonância restrita e recatada e saber viver e conviver com as suas regras mais básicas é apanágio para seres excepcionais e os que lá se mantêm por muito tempo passam a um estado quase divino, pois conjugar uma vida em dois universos tão distintos como o dos amantes e o dos outros – por muito que se tente, temos que viver nos dois – é tarefa hercúlea, para além de que combinar tão só no mesmo universo dos amantes com outra alma é missão exclusivamente destinada a seres de alguma forma deificados. Razões estas que ultrapassam a própria cosmologia do amor.


Berenice Greco 

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