quinta-feira, 29 de abril de 2010


fascículo único de auto-elegia esquizóide de um testículo de fisiologia não-fascizóide

dizer o que pensamos é sempre uma asneira. de qualquer maneira, aos quinze anos escrevi people are so fucking stupid sem saber que era impossível escapar impune de qualquer parede uma vez pintada. estrutura de argamassa e botão sem casa é o quanto nos une, e ultrapassado o ranho na cara tristemente lavada cada espécime desenvolve um intelecto que sobrevive à custa de mendicidade sem-abrigo por cima da boca incapaz de se manter deslumbrada. boquiaberto desvendei uma pega que me adestrou na perseguição de coisas com brilho. e a parede foi entretanto renovada. o que não serviu de nada. feito em plural respirámos à vez para sermos um filho. ela herdara o fôlego de um animal, eu apenas pulmões de cabidela bem temperada. naquela altura estava na moda a expressão sou eu que me quilho. era o tempo dos vinte e mais e só pelo gozo apeteceu-me tornar a investir num people are so fucking ridiculous. escapei a custo à urdidura da autoridade. se o coração tinha cada vez mais pernas, a verdade, filha-da-puta da verdade, é que no amor pelo grafíti já me pesava a idade. deixei-me disso. deixei-me de coisas, depois deixei-me de pensamentos, deixei-me de momentos de alucinações de cenas de merdas e de chinfrim. tenho a modesta impressão que pouco depois também me deixei de mim. estava nesta pasmaceira quando algum génio de pila minúscula se lembrou de inventar a bunda larga e me veio cair no colo uma brasileira que me prospectou com a mão pelo buraco da algibeira até à ilharga e lampeira perguntou cê-tá-à-fim? era boa de mais para ser verdadeira e tempus fugit apeteceu-me fazer-lhe logo ali uma oral em latim – não fosse a caganeira teria dito que sim. é bem feito para aprender a não abusar do tinto carrascão. ora, virtude é dizer que não. não há quem te mude, gritava o patrão ao despedir-me agitando o lenço. do senhor lourenço também me despedi com educação levantando-lhe apenas um dedo (por causa da recessão). é o medo, somente o medo que nos faz poupar. mas o que sobrou do tinto eu quis foi gastar em tinta, pois a rondar os quarenta achava que people are so fucking false mas parede jurava a pés-juntos não conheço nenhuma que minta. estava só. o nó, ai o nó no estômago do tamanho de um cão. a espada da azia. o passado é um osso e não há mandíbulas que consigam atingir a mão do dono. apesar da tentação. de tanto querer mordê-lo sobrevem-nos uma avalanche de cansaço. um corpo esponjoso a transbordar de anestesia. talvez por isso o único esperanto do mundo seja o sono ou a saudade que uns inventam do maternal regaço e outros afugentam do universal bagaço. people are so fucking numb foi para aí o meu canto nono. e o buraco do ozono, oh invenção enganosa!, tornou-se um franchising mesmo ao virar da esquina. já não havia nada para respirar, mas o marketing... ah! o marketing insistia! dei por mim a sufocar entre outdoors de oxigénio transgénico importado da argentina com o alto patrocínio do cata vento dezasseis que colocaram no alto do campanário imaginário que não tenho bem a certeza que exista na capela sistina (é que na televisão é tudo inventado!). asfixiado, percebi: agora a religião católica passou a funcionar a energia eólica. antes de me faltar o ar pela dízima vez fui amigar-me da parede e escrevi people are so fucking naive como quem mata a sede. vede, oh vede o milagre da igreja universal que converte a dor em euromilhões!, clamaram no estádio mesmo ali ao lado uns figurões com voz de gatchinhos e sotaque de leões. fui dis-forçadamente afastado, mas ainda bem. mesmo que quisesse investir não me sobrava vintém. e afinal os fenómenos do circo paranormal já me começavam a fazer sentir mal provocando espasmos no pubococcígeo e derrames no hemorroidal. já se vê, estava por aí nos sessenta e etecetera e tal que é aquela fase (ab)surda em que já ninguém nos aguenta e passeamos a transbordar generosamente um cálido hálito de pestilência fecal. não é que se esteja mal: ele há tempo para ler, tempo para maldizer deputados de putedos e primeiros-sinistros engenheiros da desconstrução civil, maldizendo de maneiras mil, e tempo para investir na quadrangulação enigmática milenar da sueca antes do triunfo final da cosa nostra reumática, da ciática ou de doença ainda mais terminal como sejam as pensões de insustentável leveza matemática. o que começa é a deixar de haver maneira de – como referi-lo de forma identificável mas simpática...? - saltar-lhes para a cueca. quer dizer, haver há, mas é uma seca porque depois aqui e acolá sabe-se de uns e outros que esticaram tanto que acabaram por esticar o pernil de pau feito, o que vistas bem as coisas é mais um feitio que um defeito. mas mesmo assim não dá nenhum jeito tamanha carnal paixão na hora fatídica final de cerrar o caixão. além disso, e apesar das grelhas, o que se procura na praia vetusta em ruminante imaginação de aventura são as passarinhas na estreita flor da saúde e não as congéneres velhas definhadinhas e babadas à espera do enfermeiro que as mude. bem sei que é rude, mas é mesmo assim. cresci finalmente e finalmente à parede nunca mais vim. coisa definitiva, mandei em testamento que no irreversível fim após saldar o IVA escrevessem só para mim algo terno em letras carmim: people are so fucking dead. parede demolida, agora já nada me impede - já nem sequer a vida. e, creio que a memória não me falha, se houver lá para os recônditos da infernal movida as apregoadas setenta e duas virgens ou coisa que o valha, sejam elas mal ou bem apessoadas, castanhas amarelas avermelhadas azuladas verdes brancas ou pretas, não haverá nenhum demo de forquilha ou navalha no jardim das tabuletas que me segure. enquanto a coisa dure, com ou sem camisa de vénus e desde sem-fecho-e-de-espada-à-cinta até aos mais obscuros confins de marte, para dizer o menos, cantando escreverei por toda a parte algo que é quase arte se lhe suprimirmos o fim e que basicamente diz assim people are so fucking

(toby continued, exilado para um paraíso cartografado somente nos anuários de publicidade alegadamente enganosa ou talvez)

Bill Engates

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